O cientista político e econômico, Benjamin Barber – que se interessa por temas como o hiperconsumismo, a transformação da figura do cidadão, a privatização da esfera pública, a perda de liberdade e soberania – é autor do livro "Consumido: Como o mercado corrompe crianças, infantiliza adultos e engole cidadãos" (no Brasil, publicado pela Record, 2009).
No lançamento desta obra na Itália, o jornal La Reppublica realizou/publicou (15-3-2010) uma entrevista com Barber; a qual foi traduzida por Moisés Sbardelotto e reproduzida no portal do IHU - Instituto Humanitas Unisinos.
Vale conferir alguns trechos:
Professor Barber, um dos temas centrais de "Consumido" é a regressão à fase infantil à qual o capitalismo moderno leva os consumidores. O senhor a define como a síndrome de Peter Pan. O fenômeno é mundial. Por que o epicentro originário é nos EUA?
Porque um dos aspectos fascinantes dos EUA, nação jovem, é uma espécie de inocência original: a ideia de que tudo pode recomeçar, um mito particularmente importante para os imigrantes. O Novo Mundo sempre foi fascinado pela juventude, e isso é positivo. O lado obscuro, ao invés, tem a ver com a exploração da ingenuidade infantil. Na esfera econômica, assiste-se há muito tempo uma banalização, uma infantilização dos consumos, uma estupidificação das mercadorias e também dos produtos culturais para fazer com que sejam apetecíveis aos adolescentes e às crianças. Paralelamente, é preciso dar poder econômico aos adolescentes e às crianças, até cartões de crédito, para conquistar faixas de consumidores sempre mais precoces.
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Que papel tem a infantilização do consumidor, ou daquilo que o senhor define como a transformação do adulto em um "adultescente"?
O capitalismo contemporâneo exalta o gastar em vez do economizar, o vender em vez do investir. A ideia de servir a sociedade é substituída pelo hedonismo, a centralidade do prazer, o servir a si mesmo. Adolescentes e crianças se tornam o arquétipo, o modelo do consumidor ideal porque são impulsivos, não refletem muito antes de comprar. Por isso, o marketing e a publicidade ampliaram as fronteiras dos consumos para faixas de idade sempre mais baixas: antes os adolescentes, agora também as crianças de três anos.
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No livro "Consumido", o senhor não para aqui. A passagem posterior é a denúncia das consequências para a democracia.
No capitalismo atual, a nossa identidade primária e que se sobrepõe é a do consumidor, não a do cidadão. O papel do Estado é diminuído, esvaziado, contestado. A própria política se torna marketing, os candidatos se veem como produtos de longo consumo. Consolida-se a ideia de que o único modo por meio do qual nós exercemos uma forma de poder é quando compramos.
Isso também é verdade na versão de esquerda, militante: muitos movimentos propõem mudar o mundo operando sobre as escolhas de consumo. O Slow Food nos ensina a promover o desenvolvimento sustentável quando fazemos as compras de alimentos. O Fair Trade nos leva a adquirir o café e o cacau por meio de uma rede de comércio justo que não passa pelas multinacionais e ajuda os agricultores dos países em desenvolvimento. Porém, o senhor responde também a isso.
Porque essa também é uma fábula para crianças, uma fábula de final feliz, a ideia de que se muda o mundo por meio do consumo privado. A escola dos nossos filhos, o equilíbrio climático do planeta, a independência energética: em todas essas esferas a mudança não pode vir simplesmente de escolhas individuais de compras. É a admissão de uma derrota se nós nos retiramos para a esfera da ação privada – seja a do consumo "verde" e terceiro-mundista – e abdicamos do nosso papel na política.
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A entrevista na íntegra está no IHU-Unisinos: aqui.
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Resenha do livro Consumido: aqui
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