Por Guilherme Lima Moura
Corta pra algum lugar no tempo e no espaço. Você está fazendo compras num supermercado e, a certa altura, escuta um anúncio nos auto-falantes dizendo “colaborador Pereira, compareça à seção tal”. Adiante, surgem dúvidas sobre um produto qualquer e você consulta a “associada Joseane”, que prontamente lhe atende [...].
Passa-se um mês e, de volta à mesma loja, você procura novamente: “onde está aquela jovem que me atendeu um dia desses?”. Mas – pasme! – pelo que lhe informam, ela foi recentemente desassociada. E não é mais o experiente Pereira quem é chamado pra lhe socorrer na “seção tal”, porque um processo de descolaboradorização o pegou em cheio na semana passada. É, amigo, isso mesmo: Pereira foi descolaboradorizado... Já no caixa você desabafa com aquele jovem que lhe atende: “este supermercado está cada vez pior!”. Crente de que foi contundente em sua crítica, você ouve como resposta do tal “associado”, em um quase grunhido, “e já foi bom?!”, embora em sua camisa você veja um button em que se diz algo equivalente a “amo este trabalho!”.
Corta pra você leitor, de volta ao aqui e agora. A situação descrita sugere algumas reflexões. O que terá acontecido com algumas palavras e expressões, antes comuns, como “funcionário” e “empregada doméstica”? Parece que, supostamente com o propósito de nomear novas relações, novos papéis, trocamos antigas palavras por outras mais “atuais” e... mais agradáveis aos ouvidos. Sim, porque não é difícil concordar que é bem mais atraente e agradável à auto-estima considerar-se um “colaborador” ou um “associado”, do que não passar de simples “funcionário” ou “empregado”.
Novas palavras, novas expressões, novos sentidos.
Mas será que a mudança nos nomes traz consigo alterações efetivas nas respectivas relações? Ou será que apenas suaviza (ou mesmo agrava) a realidade que tais relações apresentam? O que estaria por trás dessas mudanças? Será que é porque um colaborador colabora mais do que um empregado? Ou porque um associado, não tendo um emprego (relação “restrita à mera” troca de salário por força de trabalho), mas estando numa “associação”, entende que aquele negócio também é seu? E pensa, algo feliz: “Ora, ter patrão e estar empregado (ou desempregado) é coisa pra quem tem (ou tinha) emprego. Eu não! Eu sou associado...”. Sorri consigo mesmo e, como quem se dirige mentalmente ao presidente da empresa, emenda o pensamento: “Certo sócio?!”.
Novas palavras, novas expressões, novos sentidos... Novas realidades?
[...]
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