Na avaliação do senso comum, educação e politização andam de mãos dadas. Para a elite brasileira – de acordo com pesquisas de opinião –, o aumento da escolaridade da população tem o poder de gerar cidadãos que participam mais da vida política do país e que valorizam mais a democracia. Mas um novo estudo mostra que essa visão não corresponde à realidade.
A pesquisa de doutorado de Rogério Schlegel, defendida no Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP), utilizou análises estatísticas para interpretar os dados de pesquisas de opinião realizadas entre 1989 e 2006. O trabalho concluiu que a educação brasileira está trazendo ganhos decrescentes em termos políticos. |Agência FAPESP|
Indiferença política
Na sociologia econômica é comum o uso, por exemplo, do conceito de “retorno econômico da educação” para avaliar até que ponto uma maior escolaridade pode se refletir em maior renda, ou em maior arrecadação de impostos. Foi a partir desse conceito, que o pesquisador Rogério Schlegel trabalhou com a ideia de “retorno político da educação”.
O retorno político foi avaliado por meio de diferentes quesitos, como participação, apoio aos princípios democráticos e confiança nas instituições. Os resultados mostraram que a distância entre mais e menos escolarizados caiu marcadamente em relação à demonstração de interesse por política, consumo de notícias sobre o tema e hábito de conversar sobre ele.
“Em alguns quesitos, o nível de escolaridade é praticamente indiferente. No caso da participação em partidos, sindicatos e associações de bairro, por exemplo, o envolvimento é igualmente baixo entre os menos e mais escolarizados”, disse Schlegel.
Em 1993, de acordo com o estudo, a chance de um universitário ser muito interessado em política era 3,6 vezes maior que a de alguém com o ensino fundamental incompleto. Em 2006, as chances se reduziram para 1,6. “A diferença entre o universitário e alguém sem nenhum diploma escolar era enorme, em termos de interesse na política. Agora, a diferença ainda existe, mas é muito menor”, ressaltou Schegel.
Para o pesquisador, os resultados do estudo, ao identificar que a escolarização vem trazendo ganhos decrescentes em termos políticos, desaconselham apostas na educação como panaceia capaz de promover uma cidadania superior e fazer superar os déficits democráticos no Brasil.
“A educação importa, mas sozinha não resolve. Os efeitos benéficos da escolarização para a convivência democrática precisam de ensino de qualidade para todos para se concretizarem plenamente”, afirmou Schlegel à Agência FAPESP.
Problematizações
Para muitos, não é surpresa essa constatação de que, apesar de haver um aumento do acesso ao ensino ou do volume de escolarização, não há um acompanhado pelos ganhos esperados em matéria de comportamento político.
Aliás, na trilha desse importante estudo, convém pensar nas seguintes problematizações:
O sistema educacional brasileiro (ensino fundamental, médio e superior) realmente objetiva uma formação política, uma conscientização política-cidadã-democrática?
Qual a prioridade das escolas e faculdades/universidades senão vender capacidades e habilidades para o mercado de trabalho e oferecer pessoas bovinamente submissas ao sistema capitalista?
Não seria demais esperar uma educação em prol da politização de parte das instituições de ensino, sobretudo se privadas?
De minha parte, comungo da opinião daqueles que pensam que a reflexão-ação política, voltada para radicalidade da cidadania-democracia, não passa necessariamente por dentro desses espaços escolares/acadêmicos...
Daí a gente precisa saber o que se está aprendendo nas escolas, faculdades.
ResponderExcluirGeisy Arruda, por exemplo, se tornou celebridade dentro de uma faculdade, e por motivos nada nobres.
Vale pensar também na maneira como a TV imbeciliza a sociedade, entregando tudo mastigado, sem chamar para a discussão.