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11.5.11

O sistema

Eduardo Galeano
O sistema/1
Os funcionários não funcionam. Os políticos falam mas não dizem. Os votantes votam mas não escolhem. Os meios de informação desinformam. Os centros de ensino ensinam a ignorar. Os juízes condenam as vitimas. Os militares estão em guerra contra seus compatriotas. Os policiais não combatem os crimes, porque estão ocupados cometendo-os.
As bancarrotas são socializadas, os lucros são privatizados.
O dinheiro e mais livre que as pessoas. As pessoas estão a serviço das coisas.

O sistema/2
Tempo dos camaleões: ninguém ensinou tanto a humanidade quanto estes humildes animaizinhos. Considera-se culto quem oculta, rende-se culto a cultura do disfarce. Fala-se a dupla linguagem dos artistas da dissimulação. Dupla linguagem, dupla contabilidade, dupla moral: uma moral para dizer, outra moral para fazer. A moral para fazer se chama realismo.
A lei da realidade e a lei do poder. Para que a realidade não seja irreal, dizem os que mandam, a moral deve ser imoral.

O sistema/3
Quem não banca o vivo, acaba morto. Você é obrigado a ser fodedor ou fodido, mentidor ou mentido. Tempos de o que me importa, de o que se há se fazer, do é melhor não se meter, do salve-se quem puder. Tempo dos trapaceiros: a produção não rende, a criação não serve, o trabalho não vale.
No rio da Prata, chamamos o coração de bobo. E não porque se apaixona: o chamamos de bobo porque trabalha muito.
Eduardo Galeano. O livro dos abraços.
Tradução Eric Nepomuceno

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