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4.12.11

Sócrates Brasileiro: “Sou socialista, no sentido pleno da palavra”

No mesmo dia da morte do ex-jogador Sócrates, seu time de coração, o Corinthians conquistou o título do Campeonato Brasileiro de Futebol, tornando-se pentacampeão brasileiro. Apesar de não ser corintiano, nesse dia torci pelo Corinthians de Sócrates.

Admirava a pessoa do Sócrates, como admiro muitas outras que têm personalidade, talento e inteligência. Não o conheci a não ser por algumas de suas opiniões que tive a oportunidade de ler.

Entre as falas dele que me marcaram, estão aquelas que li na revista Caros Amigos n.159, de junho/2010. Nessa edição, foi publicada uma entrevista com Sócrates, com a chamada de capa: “Dr. Sócrates atira na seleção, nos cartolas e na mídia esportiva”. Eis trechos da apresentação e de partes dessa marcante entrevista feita pela equipe da Caros Amigos

Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira, o doutor Sócrates, ficou longe de ter sido um jogador de futebol padrão. Mesmo jogando profissionalmente, nunca deixava de fumar e tomar uma cervejinha. Afinal, entrou no esporte meio que por acidente, na mesma época em que cursava Medicina na USP de Ribeirão Preto. Para completar o perfil antítese do boleiro, “Magrão” era altamente contestador. Fazia política. Não à toa, foi um dos principais líderes da Democracia Corinthiana, movimento que abalou as estruturas do futebol e, por que não, da sociedade brasileira, no início da década de 1980, quando a ditadura agonizava.

Nesta entrevista, Sócrates, o craque da seleção nas Copas de 1982 e 1986, fala de política, ideologia e confirma que gosta mesmo é de futebol-arte. Afinal, “Ganhar não vale nada. O importante é ser feliz”.
[...]

[Caros Amigos] Você é um dos líderes da Democracia Corinthiana, fez história dentro do futebol brasileiro. Como é que surgiu essa consciência política? Foi na faculdade?
[Sócrates] Não tem um lugar. Na verdade, a tua sensibilidade política é estimulada pelos contatos que você tem. Quem me ensinou tudo que eu sei hoje, o que eu penso e o que eu sinto, foi o povo com o qual eu me relacionei. E eu tive o privilégio de estar no meio do futebol, onde o número de pessoas é muito maior do que em outras atividades.
[...]

[Caros Amigos] Você se define com uma pessoa de esquerda politicamente?
[Sócrates] Não, eu sou gente. Vivo pela gente.

[Caros Amigos] Mas, politicamente, não?
[Sócrates] Isso é bobagem. Esquerda, direita. Eu sou socialista, não sei se isso é ser de esquerda. Não sei, mas por que de esquerda? Aí é que está, são rótulos. Sou socialista, no sentido pleno da palavra. Comunista. Eu sou cubano, queria ter nascido em Cuba, sou cubano.
[...]

[Caros Amigos] De sociedade, enfim...
[Sócrates] Claro, de oportunidade, de processo educativo. Agora, Cuba é massacrada pelo sistema. O sistema global massacra quem quer fazer direito.
[...]

[Caros Amigos] Você acha que a mídia esportiva podia ter um repertório educativo?
[Sócrates] Ela tem que se educar também.

[Caros Amigos] No quê?
[Sócrates] Ela tem que saber qual o lugar dela. Não só a esportiva, a mídia em geral tem que reconhecer o seu próprio papel. O que você tem de educativo na televisão, por exemplo? Não tem nada. Que compromisso ela tem com a nação? Nenhum. Ela só explora a capacidade de consumo dessa nação. Está pouco se lixando se o povo passa fome, está pouco se lixando se está se matando, só explora o fato de forma absolutamente espetacular.
[...]

[Caros Amigos] Mas é difícil romper com essa situação, com esse sistema ideológico que é hegemônico.
[Sócrates] Só com a revolução.
[...]

[Caros Amigos] Sócrates, você acha que é possível uma revolução através do Estado, através da figura de um presidente?
[Sócrates] Não, a revolução no sentido pleno da palavra, não. Mas você pode revolucionar, transformar o seu país. O Brasil, hoje, é muito melhor do que era há dez anos. Hoje o Brasil virou gente, é respeitado. Nós não éramos nada dez anos atrás. Agora, somos uma nação, uma nação que tem atitude, que não compra, que não engole aquilo que vem mastigado, tem uma atitude. Que é o que todos nós sonhávamos quando eu nasci.

[Caros Amigos] Qual você acha que é o papel do futebol no Brasil?
[Sócrates] Futebol é a cara do Brasil. O futebol chegou no Brasil com a aristocracia. Se tornou popular por quê? Porque tem uma identidade com a cultura brasileira. Futebol tem aquilo que nós somos: liberdade, criatividade, alegria, arte e até um determinado grau de irresponsabilidade, de insolência, que o brasileiro tem. Então, é a nossa identidade cultural e a nossa linguagem. Não tenho dúvida que a linguagem do futebol é aquela que mantém viva a estrutura de nossa nação com tantas culturas distintas, com particularidades culturais distintas, do Sul, do Nordeste, do Norte. Então futebol é a nossa cara. [...]

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Vale ainda ler/ver sobre esse cara bom de bola e de cabeça
As últimas palavras de Sócrates sobre #ForaRicardoTeixeira
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