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12.5.10

“O Conciliador”?

Li na internet e vi na tv a chamada do quadro “O Conciliador”, apresentado por Max Gehringer, no Fantástico (Globo). O programa, pelo visto, busca conciliar no ar todo tipo de conflito (como brigas entre vizinhos), com exceção daqueles envolvendo crianças ou  trabalhistas. Os casos, segundo se informa, foram escolhidos pela produção do programa sob orientação do Tribunal de Justiça. E, no quadro, os acordos entre as partes passam a ter valor legal, pois a “negociação”, acompanhada por Gehringer, é feita pelos “conciliadores de verdade”. Ainda, conforme se aponta, entre os propósitos do programa, está o de divulgar a conciliação como “uma alternativa rápida e eficiente para os longos e custosos processos judiciais”, assim como uma forma de desafogar a justiça, na qual tramitam cerca de 70 milhões de processos.

Bueno, mas sobre esse assunto encontrei a seguinte opinião – muito interessante... – que partilho:

Rede Globo e o desserviço do quadro O Conciliador
A Rede Globo está prestando um enorme desserviço à população em seu novo quadro “O Conciliador”, exibido pelo Fantástico. O programa tem por objetivo solucionar conflitos interpessoais por intermédio da técnica conciliatória. Os mediadores consistem em três pessoas indicadas pelo Poder Judiciário, além do administrador empresarial Max Gehringer. O projeto é realizado em parceria com o Tribunal de Justiça de São Paulo, apoiado pelo Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. Conquanto a conciliação possua enormes méritos ao aproximar as partes, a fim de que estas transijam sobre a melhor forma de encerrar um conflito, o quadro do Fantástico parece estar mais preocupado com os “setenta milhões de processos” em trâmite atualmente no Poder Judiciário brasileiro.
As situações exibidas até agora soam como um deboche aos atores envolvidos, que são transmudados em números e estatísticas. Com efeito, na conciliação, um terceiro neutro e imparcial possui a prerrogativa de poder sugerir um possível acordo, após uma criteriosa avaliação das vantagens e desvantagens que tal proposição traria aos envolvidos. No entanto, nada disso tem sido feito. As partes são absolutamente desprovidas de informações mínimas quanto as suas garantias elementares. Enquanto isso, os conciliadores insistem violentamente para a realização de acordos, sem a menor atenção às situações complexas e singulares dos afetos em tela. Num dos últimos programas, uma das partes era absolutamente intransigente, desprovida de qualquer bom-senso a realizar acordos extrajudiciais. Mesmo assim, a insistência dos conciliadores, para a concretização do “almejado acordo” era um constrangimento atroz.
Na verdade, programas com finalidades invertidas contribuem para que o cidadão sinta-se culpado em procurar o Poder Judiciário na defesa oportuna de seus direitos, em flagrante violação ao disposto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Aludida disposição constitucional é uma garantia, principalmente quanto à eficácia das decisões judiciais em benefício dos jurisdicionados, ricos ou pobres, indiscriminadamente.
O desserviço do quadro “O Conciliador” é justamente não informar, principalmente aos pobres, que as lesões e ameaças a seus direitos não podem ser ignoradas em detrimento dos números e estatísticas do Poder Judiciário. A conciliação tem por objetivo primordial a composição do litígio pelas partes e seu efeito - apenas secundário - é a natural diminuição das estatísticas desproporcionais de lides no Brasil. Os números elevadíssimos não podem ser despejados sobre os envolvidos, a fim de que se sintam culpados e constrangidos a celebrar acordos. Parece uma piada, mas o final do quadro termina com a fala esfuziante de Max Gehringer, revelando o verdadeiro objetivo do programa: “mais dois acordos celebrados, menos duas ações a somarem-se a outras setenta milhões existentes no Brasil.”
Renata Rodrigues Ramos. Rede Globo e o desserviço do quadro O Conciliador. A Aurora de Nietzsche. 11-5-2010

Um comentário:

  1. Obrigada por publicar minha opinião sobre o tema, Gilnei. Penso que temos que permanecer sempre vigilantes diante da mídia, capaz de iludir qualquer cidadão com discursos bonitos, porém apenas panfletários. Gostei muito do seu blog. Atualmente é na leitura dos blogs que volta e meia encontramos pensamentos mais criativos e críticos à massificação vigente. Nos vemos!

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