Nos últimos tempos, Susan George argumenta que é possível aprender lições do início dos anos 40 para transformar as economias esfaceladas e interromper a mudança climática. Especificamente, ela defende que se resgate o “ projeto utópico do economista britânico John Maynard Keynes”:
Em 1942, Keynes propunha, em detalhes, um sistema de comércio internacional voltado para o pleno emprego e os direitos sociais. Ele faleceu em 1946, seu projeto nunca se concretizou; inclusive, sua proposta foi substituída pela OMC.
Consciente disso, Susan George pensa em ressuscitar o projeto utópico de Keynes e formula algumas estratégias em nome de “Um pacto para salvar o planeta”: Para ela, só a sociedade civil pode evitar a catástrofe ecológica - mas é preciso envolver governos e até empresas, num projeto que recupera idéias do keynesianismo. Uma reflexão polêmica, mas que merece ser analisada. Para tanto, eis alguns trechos de seu artigo, pulblicado no Le Monde diplomatique Brasil (jan-2008), no qual Susan George argumenta acerca desse seu pensamento:
“[...] Certamente, alguns me acusarão de querer dar ao capitalismo um novo sopro de vida. Mas vou propor, como um 'ingrediente de mudança sistêmica', uma retomada de aspectos do keynesianismo [...]. Um novo keynesianismo - dessa vez não militar, mas ambiental; um empurrão de investimento maciço em conversões e indústrias ambientalmente corretas; em fontes de energia alternativas; na manufatura de materiais leves para o uso em novos veículos e aviões; em um transporte público eficiente e limpo; na construção verde de indústrias e sua reconstrução etc.
Como poderia ser financiado um esforço assim, que envolveria gastos governamentais planejados, no sentido keynesiano tradicional? Criando impostos sobre emissão de carbono, sobre a compra de ações, sobre os lucros das corporações transnacionais e - para encorajar o consumo local - impostos sobre os quilômetros percorridos no transporte da comida que comemos e da roupa que vestimos. Nos países do Sul, a melhor medida seria o total cancelamento da dívida pública, com a condição de que uma parcela importante da economia alcançada seria destinada a conservação ambiental e conversões da produção. Também precisamos de salvaguardas para evitar uma deslocalização - agora, a das indústrias ecológicas - para a China e outros países países de salários baixos [...].
[...] Estou tentando descrever um cenário que possa ser vendido às elites, porque não imagino que elas vão abraçar valores ambientais e conversões se não houver nada em troca para elas. Mas esta visão não é meramente um esforço cínico para conseguir que ajam de acordo com nossos interesses. Também há muitas vantagens para os trabalhadores, em uma economia assim. Uma grande conversão ecológica é trabalho para uma sociedade de tecnologia, habilidades, produtividade e empregos avançados. Ela seria apoiada, imagino, por toda a população, porque significaria ter não apenas um ambiente melhor, mais limpo e com um clima mais ameno, mas também empregos, melhores salários, assim como uma proposta humanitária e justificativa ética - assim como a luta contra o nazismo e o fascismo [...].
Antes que vocês me digam que nada disso vai funcionar, que minha solução é pior do que um sonho inalcançável, que vocês não querem mesmo salvar o capitalismo e que perderam seu tempo comigo, por favor, deixem-me sustentar mais uma idéia. A solução econômica pode vir de um grande compromisso do tipo keynesiano, que articule governo, empresas e cidadãos. Mas tal esforço teria também um papel vital ao criar coesão social renovada.
Quero dizer com isso que muitas sensibilidades deveriam se unir numa causa comum. Politicamente falando, hoje nenhum grupo social único está em condições de resolver os problemas que afetam a maioria. Ou seja, os ecologistas não podem, sozinhos, salvar o meio ambiente; os agricultores não podem, sós, salvar a agricultura familiar; os sindicatos não podem, isolados, salvar os bons empregos na industria etc. Grandes alianças são o único caminho, a única estratégia que funciona. Começamos a ter sucesso agindo democraticamente e construindo alianças entre pessoas que vêm de grupos sociais distintos, mas estão basicamente na mesma sintonia. Os Fórum Sociais estão contribuindo enormemente para esse processo. Agora nós devemos ir além deste estágio: tentar forçar alianças também com grupos com quem não necessariamente concordamos nas questões principais - por exemplo, com as empresas. Isso só pode ser obtido ao reconhecermos que a divergência, ou mesmo o conflito, podem ser positivos, desde que as áreas em que é possível atuar em conjunto sejam procuradas, identificadas e construídas. Devemos encontrar o lugar onde os círculos de nossos interesses se encontram. Pelo menos um desses pontos deve ser salvar o planeta. Eu não vejo outro jeito de gerar entusiasmo cidadão, envolvimento e o salto qualitativo e quantitativo na escala do que necessitamos agora.”
Susan George.
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