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9.8.10

Dogmática jurídica


A racionalidade jurídica moderna – fixando/valendo-se da impossibilidade de interpretação do dogma – fez deste a base das concepções modernas de direito (jusnaturalismo e positivismo). Tanto que as teorias de direito modernas mitificaram o dogma (jurídico), dando-lhe autoridade. E, assim, o direito deslocou-se do mundo da vida para o mundo das instituições, limitou-se a meras abstrações arbitrárias separadas da realidade concreta e legitimadoras de opressão, assim como passou a ter aprisionado o seu papel de transformação.

Pode-se dizer que como resultado e à serviço disso, formou-se a dogmática jurídica, enquanto paradigma, ciência do direito (positivo). Explicando melhor: como tal esta dogmática estabeleceu-se, paulatinamente, pela convergência de um conjunto de diversos processos parciais e conseqüentes – reunidos basicamente em uma matriz política (poder estatalista-legalista) e uma matriz epistemológica (saber científico).
No desenrolar desses processos destaca-se:  

  • a superação das antigas doutrinas de direito natural;

  • a consolidação de um modelo de Estado caracterizado pelo monopólio estatal da criação (via Poder Legislativo) e aplicação (via Poder Judiciário) da lei/direito;

  • o desenvolvimento de idéias e puros conceitos, objetivando a cientificidade do direito;

  • a separação entre teoria e práxis/prática, e conseqüente afirmação de um modelo de saber jurídico como atividade prioritariamente teórica, avalorativa/neutra e descritiva;

  • a formulação de uma concepção moderna de Ciência Jurídica. (FARIA, 1988)
Dessa maneira, reunindo múltiplos elementos, a dogmática jurídica fixou-se como a moderna ciência do direito propondo-se entre outros fins:

  • a difundir o direito, basicamente, como um modelo axiomático (um dogma jurídico verdadeiro por si mesmo, que não precisa de qualquer justificação além da própria existência), como um sistema completo, coerente, perfeito, neutro, formal, formado por esquemas conceituais abstratos, inflexíveis e gerais (ou seja, as normas jurídicas) que descartam como irrelevante tudo aquilo que as mesmas não prescrevem (separadas da realidade do mundo).

  • a reproduzir apenas a lei/direito, sem qualquer reflexão e questionamento sobre seus fundamentos de legitimidade; estabelecendo um legalismo, de maneira a supor uma obediência à norma jurídica, ignorando qualquer motivação ética.

  • a fixar uma cientificidade abstrata e formal do direito, construída e aprendida por puros e eternos conceitos (direito explicado por conceitos doutrinários e verbetes jurisprudenciais).

  • a enraizar o saber jurídico técnico vinculado ao cultivo de métodos objetivos e verificáveis e que exclua todas as considerações valorativas/axiológicas. (FARIA, 1988)
Daí que, em razão de, em síntese, basear-se e difundir o “modo liberal-individualista-normativista”, que caracteriza o modo de pensar da modernidade, a dogmática jurídica sofre inúmeras críticas. Basta estar que há um variado movimento contradogmático no pensamento jurídico, que tenta afastar o modelo moderno do direito e propor diferentes caminhos para a construção de um novo saber jurídico adequando às profundas, complexas e constantes transformações da sociedade e do Estado.

FARIA, José Eduardo. Eficácia jurídica e violência simbólica: o direito como instrumento de transformação social. USP, 1988.
MONTEIRO, Cláudia Servilha. Temas de filosofia do direito: decisão, argumentação e ensino. Florianópolis: Boiteux, 2004.
WARAT, Luís A. Introdução geral ao direito: a epistemologia jurídica da modernidade. Vol. II, Porto Alegre: SAFe, 1995.

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