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11.8.10

O Plínio de Arruda - do bem!


Veracidade subjetiva e a paz de espírito
Por Eugênio Bucci
"Twitter, my friends!"
Assim falou Plínio de Arruda Sampaio. E prosseguiu:
"É twitter! Eu sou o maior twittador agora."

Com essa conclamação, o candidato à presidência da República pelo PSOL intimou seus seguidores a "twittar" e entrar "diretamente" no debate político. Aos 80 anos de idade, vem esbanjando jovialidade – e não apenas quando demonstra familiaridade com certas modas tecnológicas. No debate da TV Bandeirantes, na quinta-feira (5/8), era ele o mais bem-humorado, o menos previsível, o menos careta. Plínio tinha mais frescor e mais presença de espírito. Roubou a cena, como disseram.

[...] O brilho particular dessa candidatura nanica não se deve simplesmente à condição daquele que, não tendo nada a perder, sai por aí bancando o franco atirador, como também já se disse. Ele não está fazendo o tipo "aventureiro feliz". Há mais elementos nessa história, há algo mais interessante aí. No meu modo de ver, Plínio se comunica bem porque está bem – em tempo, é justamente por isso que o tema me interessa, por se referir à qualidade da comunicação política entre um candidato e seu público –, porque está inteiro no que diz. Ele dá a sensação de não ter uma agenda oculta. Ele olha no olho do interlocutor e manda ver. Que outros candidatos podem se abrir da mesma forma?

É por aí que começo a minha discussão.

Sejamos acadêmicos...
É notório, notável e incrível como o candidato do PSOL está de bem consigo próprio. Ele é "o Plínio do bem", como brinca, e também o Plínio de bem. É por isso, também, que consegue olhar direto nos olhos da gente sem pestanejar, sem piscar, sem vacilar, e dizer o que pensa com naturalidade. Ele não tem rancor ou raiva; tem apenas determinação. E aí fazer essa conversa olho-no-olho – para usar aqui a expressão preferida do jornalista Celso Nucci, quando discorre sobre comunicação pública.

Não se pode afirmar que Plínio enuncie "a" verdade, uma vez que suas teses são, no mínimo, controversas, e às vezes carregam uma nostalgia utópica com toques de baile da saudade. Mas, de outro lado, não há dúvida de que ele fala "a sua" verdade, sem torcer nem edulcorar. Pode parecer pouco, mas isso o diferencia radicalmente dos outros. Nesse sentido, tenho a impressão que o diferencia não é tanto o programa, mas a postura pessoal, embora as duas coisas não se desvinculem por inteiro.

Quero me deter um pouco mais sobre isso de alguém falar "a sua" verdade, uma verdade na qual acredita sinceramente. Peço licença para um breve exercício de pedantismo. Vou citar um filósofo que andou em voga de algumas décadas para cá, Jürgen Habermas. Se o leitor vai se espantar, vai se abespinhar, vai falar "ah, assim não dá", o problema é do leitor. Eu vou citar Habermas assim mesmo.

A certa altura da sua Teoria da Ação Comunicativa, o filósofo alemão se refere à "veracidade subjetiva" como uma das características da fala do sujeito orientado para o entendimento. Tem a tal "veracidade subjetiva" aquele que expressa uma idéia que, em sua consciência, de boa fé, ele toma por verdadeira. Nesse caso, "a intenção expressada pelo falante coincide realmente com o que ele pensa", escreve Habermas. Poderíamos chamar a isso de honestidade intelectual; rigorosamente, a veracidade subjetiva seria apenas um dos aspectos daquilo que costumamos chamar de honestidade intelectual. Tanto que Habermas lista de três pretensões de validade a ser atendidas pelo cidadão que se orienta para o entendimento. As outras duas são a "retidão normativa" e a "verdade proposicional", das quais não vou me ocupar agora. Fiquemos, então, com esse requisito apenas, o da veracidade subjetiva, ou, em outras palavras, fiquemos apenas com essa parcela do que poderia ser a honestidade intelectual. Pronto. Fim da citação de Habermas.

... mas não sejamos tão complicados
A gente olha nos olhos apertados de Plínio de Arruda Sampaio e somos convidados a crer que ele crê na coincidência entre o que diz e o que pensa. Ele parece, no mínimo parece, acreditar que o que diz coincide com o que pensa. Não é pouco, não é mesmo. Ao vê-lo discursar, o espectador não se vê surpreendido pela desconfiança de que, em privado, ele diria algo diferente. Não há sinais de que ele nos esconda uma parte do que pensa. É fantástico.

Outra coisa, totalmente outra, é saber se o que ele diz é verdadeiro. Ou, em outras palavras, outra questão seria saber se, verdadeiramente, o que ele prega representa a melhor solução para o Brasil. [...]

Se é verdade que, ouvindo o Plínio, a gente, ainda que não concorde com o que ele diz, tende a acreditar que ele acredita no que diz – e, logo, acredita que ele não está tentando nos tapear –, temos aí um ponto que merece atenção. Ele nos propõe um jogo limpo, e por isso se sobressai. Ele não é o que é por não ter nada a perder, mas talvez por não ter nada a esconder. Aí está sua veracidade subjetiva, uma condição que quase nunca a gente encontra num político. [...]

Ele não é fanático, não é um profeta dos fanáticos, é apenas um ego tranqüilo, que, mais do que não ter nada a perder, não deve nada a ninguém.

Conheço Plínio de Arruda Sampaio de outros carnavais, de outras quaresmas, de outras procissões. Nunca o admirei tanto como agora.
Eugênio Bucci. Jornalista, professor da ECA-USP.
Ler o texto integral no Observatório da Imprensa. Edição 602 de 10-8-2010.

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