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28.10.10

STJ autoriza federalização do caso Manoel Mattos

Um marco na luta pela defesa dos direitos humanos: primeiro pedido de Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) – também conhecido como federalização – é aceito pelo STJ.

Por maioria de votos, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu, em 27-out-2010, o pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) de federalização do processo sobre a morte do ex-vereador, advogado e defensor dos direitos humanos Manoel Mattos, ocorrida em janeiro de 2009, em Pitimbu, litoral sul da Paraíba. Com isso, o caso será retirado da Justiça Estadual e transferido para a Justiça Federal da Paraíba.

Essa é a primeira vez que o Incidente de Deslocamento de Competência (IDC), também dito federalização, é aplicado no país.

Histórico
A PGR pediu ao STJ a federalização dos processos que tratam da atuação de pistoleiros e de grupo de extermínio na divisa dos estados da Paraíba e Pernambuco, especificamente, na região dos municípios de Pedras de Fogo (PB), Itambé (PE) e Timbaúba (PE) (ver a íntegra do pedido). Antes, um requerimento foi feito à PGR pelas organizações da sociedade civil Justiça Global e Dignitatis – Assessoria Técnica Popular indicava que, em dez anos, mais de 200 execuções sumárias foram praticadas por tais grupos de extermínio. 

A impunidade nessa região teria causado a morte do ex-vereador, advogado e defensor dos direitos humanos Manoel Bezerra de Mattos Neto, que se encontrava sem proteção policial. Morador de Itambé (PE), ele tinha forte atuação contra o crime organizado. O assassinato ocorreu apesar das medidas cautelares de proteção a Manoel Mattos decretadas, desde 2002, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), proteção que caberia à Polícia Federal.

No pedido encaminhado ao STJ, a PGR narrou que, em novembro de 2005, Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados recomendou diversas medidas especiais sobre os crimes ocorridos na divisa da Paraíba e Pernambuco aos governos federal e estaduais e aos Ministérios Públicos e Tribunais de Justiça de ambos os estados. Mesmo assim, não se tomou providências quanto à repressão e investigação dos crimes, o que resultou, entre outras mortes, no assassinato de Manoel Mattos, cuja atuação contra os grupos de extermínio seria pública.

Requisitos para o deslocamento
O Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) pressupõe, simultaneamente, a constatação de grave violação de direitos humanos e a possibilidade de responsabilização internacional decorrente de obrigações assumidas em tratados internacionais. O Brasil é signatário dos principais atos internacionais de proteção de direitos humanos e pode ser responsabilizado pelo não cumprimento dessas obrigações, diante do reconhecimento da jurisdição da CIDH/OEA.

No caso, o Brasil já teria descumprido medidas cautelares de proteção determinadas pela CIDH, resultando na morte de Manoel Mattos e de outra pessoa (Luís Tomé da Silva Filho, testemunha, ex-integrante de um grupo de extermínio).

De acordo com a PGR, a incapacidade dos estados-membros em oferecer resposta ficou evidenciada na falta de resultados práticos das investigações, bem como no envolvimento de seus agentes, em diversos níveis hierárquicos.

A ofensa ao direito à vida estaria evidente por parte de grupos organizados em atividade reiterada, com a premissa de “afastar do Estado-juiz a possibilidade de exercer a jurisdição, pois tais grupos de extermínio atribuem-se a capacidade de decidir (e executar) a punição àqueles que, por eles, são tidos como infratores das regras de vida em sociedade”. Além disso, o homicídio do ex-vereador seria uma situação excepcional de violação de direitos humanos, pois também teve como elemento motivador a intenção de fazer calar uma das vozes que se levantavam contra a impunidade. (STJ - PGR)

IDC/Federalização
A federalização está prevista na Constituição desde 2004, quando foi introduzida pela Emenda Constitucional nº 45/04 (reforma do Judiciário), para hipóteses de grave violação aos direitos humanos.

Até então o Incidente de Deslocamento de Competência não havia sido aplicado. O único pedido de federalização apreciado pelo STJ tinha sido julgado improcedente em 2005. O IDC nº 1 tratava do caso do assassinato da missionária Dorothy Stang, no Pará. Naquela ocasião, o pedido de deslocamento foi negado pelo STJ, ficando decidido que a Justiça do Pará continuaria responsável por julgar os envolvidos nesse crime.

Um comentário:

  1. Meu caro, na verdade, este trata-se do Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) nº 2. O número 1 é esse aqui: http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Justica/detalhe.asp?numreg=200500293784&pv=010000000000&tp=51

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