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16.11.10

Juiz com banqueiro é normal, mas com movimento social é ato ilícito

Em entrevista ao Nota de Rodapé (NR), o juiz de direito e professor em São Paulo, Marcelo Semer, além de apontar falhas graves na formação dos bacharéis de direito e alertar para o distanciamento de magistrados da realidade do país, faz críticas pertinentes à política de penalização/criminalização e ao Poder Judiciário. Como se nota nesse trecho da entrevista concedida a Ricardo Viel, jornalista e colunista do NR:
[...]
NR – Essa postura do Poder Judiciário de punir de forma pesada crimes irrisórios não estão, também, baseadas numa sensação de insegurança que tem a classe média, da qual os magistrados fazem parte?
Marcelo Semer: Tem uma dimensão política também. As pessoas acham que se aumenta o número de crimes as penas devem ficar mais severas. Mas na verdade, se a pessoa chega no crime é porque alguns dos outros controles já falharam: a família, os amigos, o emprego. E quando essa pessoa volta da cadeia, a possibilidade dela reconstruir esses laços é menor ainda. O laço do emprego já foi, por exemplo. Olha só, o direito penal, via de regra, tutela os interesses dominantes. Qual o forte do nosso direito penal? O patrimonial. Talvez hoje esteja mais mesclado, mas se você pegar o Código Penal de 1940, o centro dele é o patrimônio. O sequestro, por exemplo, é um crime grave ou leve? É leve. Pena mínima de um ano. Grave é quando você exige dinheiro, porque então é extorsão mediante sequestro. Se você sequestrar para fim libidinoso, é rápido. Por exemplo, se eu e você entrarmos num lugar com a mão debaixo da blusa pra roubar, são cinco anos e quatro meses. Ao passo que o crime de corrupção é menos do que isso. Lesão corporal grave a pena é de dois anos. É por isso que só tem pobre na cadeia, porque os crimes praticados pelos pobres são mais severamente apenados.

NR - O Poder Judiciário tem um ranço pelo pobre?
Marcelo Semer: Não tem jeito, o Estado privilegia quem tem mais. Pensa comigo, todos esses clubes de São Paulo, nenhum deles comprou seu terreno. Todos são públicos e estão cedidos para a diversão da classe média. Quantos clubes públicos você tem em São Paulo? Para aquele que precisa? Isso é em todas as esferas. Não tem pobre na magistratura, mas também não tem rico. Não é por isso que você deve desatentar para as questões sociais. Por isso que deve dosar estudo com o conhecimento da realidade social. Parece que a gente é reprimido quando quer ter contato com movimento social, conhecer a realidade social. O juiz encontra com banqueiro, participa de congressos de banqueiro, é normal, mas se encontra com movimento social está participando de ato ilícito.

Ler a íntegra desta entrevista no Nota de Rodapé.

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