Suspensa a licença que autoriza início das obras de Belo Monte
Sem medidas preparatórias nenhuma obra da usina pode ser iniciada
A Justiça Federal - Seção Judiciária do Pará - determinou (25-fev) a suspensão imediata da licença concedida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para instalação do canteiro de obras da hidrelétrica de Belo Monte, na região do Xingu, centro-oeste do Pará. Com a decisão, todas as obras que eventualmente tenham começado no local deverão ser paralisadas, a partir do momento em que a empreiteira construtora for intimada.
Na liminar que determinou a suspensão, o juiz federal Ronaldo Desterro, que responde pela 9ª Vara, especializada em ações de natureza ambiental, também proíbe o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) de transferir recursos financeiros à Norte Engenharia Sociedade Anônima (Nesa) – que vai construir a hidrelétrica. A proibição será mantida até que seja proferida a sentença de mérito ou até que se comprove o cumprimento das condicionantes previstas na licença prévia anteriormente concedida pelo Ibama.
O magistrado concordou com os argumentos expostos pelo Ministério Público Federal, que ajuizou ação civil pública contra o Ibama, o BNDES e a Norte Engenharia S.A.. Segundo o MPF, a licença expedida pelo Ibama é ilegal porque não foram atendidas pré-condições estabelecidas pela própria autarquia para o licenciamento do projeto, como a recuperação de áreas degradadas, preparo de infraestrutura urbana, iniciativas para garantir a navegabilidade nos rios da região, regularização fundiária de áreas afetadas e programas de apoio a indígenas.
Segundo o Ministério Público, até a emissão da licença provisória, 29 condicionantes não tinham sido cumpridas, quatro foram realizadas parcialmente e sobre as demais 33 não há qualquer informação. No ano passado, o MPF questionou a Norte Energia sobre o cumprimento das condicionantes. A concessionária pediu ampliação de prazo para dar a resposta, que acabou não sendo apresentada. Para o MPF, essa situação “evidencia que o processo de cumprimento das condicionantes está em um estágio inicial que não permitia a concessão da licença”.
Na decisão que concedeu a liminar, o juiz Ronaldo Desterro diz que, em lugar do Ibama conduzir o procedimento, acaba por ser a Nesa quem, em defesa de seus interesses, suas necessidades e seu cronograma, tem imposto ao Ibama o modo de condução do licenciamento da hidrelétrica de Belo Monte. “De fato, a autarquia [Ibama], que deveria impor ao empreendedor a adaptação de suas necessidades à legislação de vigência, adota conduta contrária, consistente em buscar a adaptação da norma às necessidades da empreendedora, sem invocar fundamento razoável. A relação de preponderância do interesse público sobre o particular encontra-se, na espécie, invertida”, afirma o magistrado.
Ronaldo Desterro acrescenta que, se a Administração pretende mesmo dispensar o cumprimento de condicionantes de uma fase específica de implantação do projeto de construção da hidrelétrica, é necessário “que demonstre, de modo claro, a ausência de prejuízo ao meio ambiente e a todos que se encontram na iminência de serem afetados pela construção da usina”. |Informações da Justiça Federal do Pará - Processo nº 968-19.2011.4.01.3900 9º Vara Federal em Belém - Íntegra da ação - Íntegra da licença suspensa pela decisão |
MPF já ajuizou mais outros nove processos
O projeto hidrelétrico também motivou o ajuizamento, pelo MPF, de mais outros nove processos, todos por violações à legislação. Em um deles houve sentença transitada em julgado, a favor do MPF. Os outros nove processos aguardam a palavra final da Justiça.
As ações questionam não só o desrespeito às regras do licenciamento ambiental mas também os números apresentados nos estudos do projeto. Entre eles, destaca-se os relativos à quantidade de água que será liberada no trecho de cem quilômetros da Volta Grande do Xingu, por onde o rio não mais passará em virtude de um desvio. Trata-se de uma região onde vivem pelo menos 12 mil famílias e 372 espécies de peixes.
A Eletrobras propõe que a Volta Grande seja irrigada com apenas 4 mil metros cúbicos por segundo. O Ibama diz que deve ser o dobro e que, ainda assim, haverá o desaparecimento de várias espécies de peixes.
Os peritos do MPF mostraram que nenhum nem outro têm razão. Analisando o volume de água do Xingu na série histórica de 1971 a 2006, comprovaram que as turbinas só geram energia se passarem por elas 14 mil metros cúbicos de água por segundo. Somaram esse volume aos 8 mil metros cúbicos de água por segundo propostos pelo Ibama. Chegaram a 22 mil metros cúbicos de água por segundo.
Nos 35 anos analisados pelo MPF, no entanto, em 70% do tempo o Xingu não foi capaz de atingir esse volume, nem nas épocas de maior cheia. “Os estudos demonstram que não há água suficiente para gerar energia naquela que, se um dia sair do papel, será a obra mais cara do Brasil”, ressalta Pontes Jr. “A sociedade precisa ter a chance de discutir seriamente esse projeto”.
Migração
Estimativas extra-oficiais às quais os procuradores da República tiveram acesso apontam que o simples anúncio da obra, no ano passado, já atraiu cerca de 8 mil pessoas em busca de emprego para a cidade de Altamira, a maior da região. A atração populacional pode causar um colapso nos já precários sistemas de abastecimento, saneamento, saúde e educação, informa o procurador da República em Altamira Cláudio Terre do Amaral. |Informações do MPF/PA|
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