O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou
constitucional a política de cotas étnico-raciais para seleção de estudantes da
Universidade de Brasília (UnB). Por unanimidade, os ministros julgaram
improcedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF 186,
ajuizada na Corte pelo Partido Democratas (DEM), que questionava a reserva de
20% das vagas previstas no vestibular para preenchimento a partir de critérios
étnico-raciais.
No julgamento ocorrido nos dias 25 e 26 de abril de 2012, os ministros seguiram o voto do relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski, o qual afirmou que as políticas de ação afirmativa adotadas pela
UnB estabelecem um ambiente acadêmico plural e diversificado, e têm o objetivo
de superar distorções sociais historicamente consolidadas. Além disso, segundo
ele, os meios empregados e os fins perseguidos pela UnB são marcados pela
proporcionalidade, razoabilidade e as políticas são transitórias, com a revisão
periódica de seus resultados.
Ao concordar com o relator, o ministro Joaquim Barbosa (único ministro negro do STF) afirmou que o voto do ministro Lewandowski
praticamente esgotou o tema em debate. Ressaltou, porém, que “não se deve
perder de vista o fato de que a história universal não registra, na era
contemporânea, nenhum exemplo de nação que tenha se erguido de uma condição
periférica à condição de potência econômica e política, digna de respeito na
cena política internacional, mantendo, no plano doméstico, uma política de
exclusão em relação a uma parcela expressiva da sua população”.
Na ação, ajuizada em 2009, o DEM questionou atos
administrativos do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da Universidade de
Brasília (Cepe/UnB) que determinaram a reserva de vagas oferecidas pela
universidade. O partido alegou que a política de cotas adotada na UnB feriria
vários preceitos fundamentais da Constituição Federal, como os princípios da
dignidade da pessoa humana, de repúdio ao racismo e da igualdade, entre outros,
além de dispositivos que estabelecem o direito universal à educação.
O DEM sustentava que a UnB “ressuscitou os ideais nazistas”
e que as cotas não são uma solução para as desigualdades no país. “Cotas para
negros não resolvem o problema. E ainda podem ter o condão de agravar o
problema, na medida em que promovem a ofensa arbitrária ao princípio da
igualdade”. De acordo com o partido, sua intenção não era discutir a
constitucionalidade das ações afirmativas de forma geral, como política
necessária para a inclusão de minorias. Também “não se discute sobre a
existência de racismo, de preconceito e de discriminação na sociedade
brasileira”. O que a legenda queria discutir, de acordo com a ação, é “se a
implementação de um Estado racializado ou do racismo institucionalizado, nos
moldes praticados nos Estados Unidos, na África do Sul ou em Ruanda seria
adequada para o Brasil”. Quando propôs a ação, em julho de 2009, o DEM pediu
liminar para suspender a matrícula dos aprovados no vestibular da UnB. O então
presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, rejeitou o pedido. Agora,
ao julgar o mérito da ação, o Supremo a rejeitou integralmente. |Cf. Conjur|
A constitucionalidade das cotas foi defendida pela
Procuradoria Geral da República, que deu parecer favorável à reserva de
vagas por critérios raciais. Durante o
julgamento, a vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, defendeu a
utilização de cotas e desconstruiu argumentos sustentados pelo partido
Democratas, autor da ação, em relação à miscigenação, ao mito da democracia
racial, meritocracia e a questão da discriminação econômica. “Saímos de uma
igualdade meramente formal pra uma igualdade material; de uma sociedade
supostamente homogênea, cuja homogeneidade tinha na verdade um grupo hegemônico
que informava todos os valores que determinavam o caldo cultural por ele
marcado, para uma sociedade plural”, afirmou Deborah Duprat. |PGR-MPF|
Depois de dois dias de julgamento, prevaleceu a tese de que
a reserva de vagas em instituições de ensino público busca a chamada
“igualdade
material
”: a criação de oportunidades para quem não as tem em situações
normais.
Ao final do julgamento, o relator do caso, Ricardo Lewandowski, disse que o STF
“confirmou a constitucionalidade das ações afirmativas para grupos
marginalizados como um todo”. Ou seja, cotas sociais, por exemplo, também
são constitucionais. A decisão, segundo ele, vale para todo o ensino público.
A decisão ressaltou a necessidade de haver
“proporcionalidade e razoabilidade” na quantia de vagas e de prazos para as cotas, que devem durar o tempo
necessário para corrigir as distorções sociais que pretendem solucionar.
O STF não decidiu que as universidades são obrigadas a estabelecerem cotas. O
que ele decidiu é que não é inconstitucional estabelecerem tais cotas, se elas
decidirem faze-lo.