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2.7.10

Pedagogia da Autonomia

Revisitei “Pedagogia da Autonomia”, de Paulo Freire, com seus “saberes necessários à prática educativa”. Apesar de se destinarem mais para quem está próximo ou vai se aproximar da educação, os ensinamentos freireanos - reunidos nesse pequeno-grande-livro - são recomendados para todos(as).

Esta obra merece ser lida e relida na integra, não há dúvidas. Entretanto, vou arriscar expor apenas alguns dos saberes indispensáveis que nos legou Paulo Freire. De início, ele nos reafirma sua crítica a concepção bancária da educação, dizendo que precisamos nos convencer “definitivamente de que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”.

Nesse sentido, temos de saber que ensinar é fundamentalmente pensar certo. O que é difícil reconhece Paulo Freire: “É difícil, entre outras coisas, pela vigilância constante que temos de exercer sobre nós próprios para evitar os simplismos, as facilidades, as incoerências grosseiras. É difícil porque nem sempre temos o valor indispensável para não permitir que a raiva que podemos ter de alguém vire raivosidade que gera um pensar errado e falso.” Agora, apesar de ser “uma postura exigente, difícil, às vezes penosa, que temos de assumir diante dos outros e com os outros, em face do mundo e dos fatos, ante nós mesmos”, precisamos pensar certo.

Além disso, entre outros saberes indispensáveis, no pensamento político-pedagógico freireano, estão “a apreensão da realidade”, “a convicção de que a mudança é possível” e a de “compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo”.

Dentro disso, em síntese, ele nos diz que a nossa educabilidade – em um nível distinto do nível do adestramento dos outros animais ou do cultivo das plantas – está na capacidade de aprender, não apenas para nos adaptar mas sobretudo para transformar a realidade, para nela intervir, recriando-a. E, convicto de que a mudar é difícil, mas é possível, Paulo Freire nos estimula a programarmos a nossa ação político-pedagógica.

E destaca o “saber da História como possibilidade e não como determinação. O mundo não é. O mundo está sendo”. Daí que, como subjetividade curiosa, inteligente, interferidora na objetividade com que dialeticamente nos relacionamos, nosso papel no mundo não é só o de quem constata o que ocorre, mas também o de quem intervém como sujeito de ocorrências. Não somos apenas objeto da História, mas seu sujeito igualmente. No mundo da História, constatamos não para nos adaptar, mas para mudarmos.

E prossegue Paulo Freire, chamando atenção para o fato de que “ninguém pode estar no mundo, com o mundo e com os outros de forma neutra”. Não podemos “estar no mundo de luvas nas mãos constatando apenas”. Assim, “há perguntas a serem feitas insistentemente por todos nós e que nos fazem ver a impossibilidade de estudar por estudar. De estudar descomprometidamente como se misteriosamente, de repente, nada tivéssemos que ver com o mundo, um lá fora e distante mundo, alheado de nós e nós dele.”

Nessa perspectiva “a mudança do mundo implica a dialetização entre a denúncia da situação desumanizante e o anúncio de sua superação, no fundo, o nosso sonho”. Denunciar as desumanidades, por que passam as maiorias compostas de minorias, que não perceberam ainda que juntas seriam a maioria. Denunciar que nada pode legitimar uma ordem desordeira, na qual só as minorias do poder esbanjam e gozam enquanto se diz às maiorias - em dificuldades até para sobreviver - que a realidade é assim mesmo, que sua fome é uma fatalidade. “A fome frente a frente à abastança e o desemprego no mundo são imoralidades e não fatalidades”, revela Paulo Freire. E essa prática político-pedagógica, de desnudamento da realidade perversa, vem acompanhada pela ação de fazer saber que o sonho da superação é possível.

Enfim, isso é parte daquilo que nos faz compreender que a exigência de ensinar-aprender implica criar as possibilidades para a apreensão da realidade, para confiar que mudar é possível, para a intervenção no mundo da vida e muito mais como nos ensina Paulo Freire, com seus “saberes necessários à prática educativa”, na obra “Pedagogia da Autonomia” (Paz e Terra).

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